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DESCRIÇÃO TEMÁTICA

No ponto de partida de sua reflexão sobre os conceitos de soberania e de estado de exceção, Giorgio Agamben recupera a dupla diretriz de investigação de Michel Foucault, segundo a qual o poder se desdobraria em duas linhas: por um lado na especialização de técnicas políticas e, por outro, em novas tecnologias de individualização. Agamben indaga ainda, quase que perifericamente, o quanto o poder midiático-espetacular configuraria um cenário no qual essas duas instâncias seriam, talvez, indissociáveis. A interdependência entre as artes de governar e as modalidades de produção do eu são uma sugestão antiga da própria teoria foucaultiana, e o estudo de seus pontos de contato são quase um lugar comum da crítica que se debruça sobre sua obra. Caberia, porém, seguindo a provocação de Agamben, indagar o quanto essas linhas são indiscerníveis no papel da mídia e das mediações de massa, em especial se tomado à luz dos desdobramentos dos conceitos de soberania e estado de exceção na teoria agambeniana, isso é, enquanto potência de legitimação da violência que se dá no limite do aparato jurídico do estado de direito. Se já no final de década de sessenta, Guy Debord situava o espetáculo como uma especialização dos mecanismos de poder através da mediação por imagens, não faltam linhas de investigação que apontam para esse ambíguo papel político da mídia ao longo dos últimos cinquenta anos, em especial enquanto gestora da visibilidade do espaço público e instância de legitimação da violência urbana. Seria interessante, nesse sentido, indagar, mais uma vez a respeito da prerrogativa benjaminiana segundo a qual o estado de exceção teria se convertido na regra, trazendo-a para um cenário contemporâneo espetacular midiático, onde a soberania talvez se exerça não tanto pela suspensão do jurídico, mas pela deliberação de quais indivíduos merecem sua plena e violenta aplicação, constituindo, assim, um mecanismo de discernimento entre quais corpos são violáveis e quais não. Cumpre ainda investigar o quanto o crescimento exponencial da circulação de informação em rede, no lugar dos modelos de tipo broadcasting que predominavam desde a radiodifusão, reconfigura ainda os mecanismos midiáticos, na medida em que, no lugar de uma dissociação radical entre produção e recepção de conteúdo, prevaleça sua aproximação, em um cenário Web 2.0. Diversos fenômenos que já foram abordados em termos como a espetacularização da intimidade, ou a realimentação narcísica por parte dos mecanismos opinativos da rede, poderiam constituir, assim, indícios de uma necessidade de pensar a mediação enquanto poder soberano não apenas em um paradigma de produção/recepção, mas também enquanto monopólio dos códigos de significação de uma cultura de violência e dos horizontes possíveis de circulação no universo digital.

A realização de um seminário de pesquisa voltado para a problematização do estatuto político dos mecanismos de mediação de massa se torna extremamente relevante enquanto espaço de diálogo entre as diferentes pesquisas científicas que se voltam para temas como o papel da mediação midiática, a indústria cultural, a cultura pop ou a representação da violência urbana. O tema se torna especialmente pertinente tendo em vista as diversas discussões que recentemente têm sido levantadas a partir do contexto político brasileiro imediato, no qual as discussões sobre a mídia e a soberania encontram novo fôlego. Trazer tal discussão para o espaço da Pós-Graduação em Literatura abre espaço ainda para um intercâmbio com as pesquisas de áreas afins tais como a História, a Sociologia, a Antropologia, a Filosofia, ou a Comunicação Social, possibilitando diálogos que escapam do âmbito estrito de cada uma dessas áreas isoladamente, mas que se dão desde seu contato e indistinção. Integrar as pesquisas desenvolvidas em diferentes áreas de conhecimento se faz, nesse sentido, oportunidade privilegiada para o surgimento de novos pontos de inflexão que tangem as pesquisas sobre mídia e mediação. É importante ressaltar ainda a preocupação em abordar as novas mídias e tecnologias de circulação de informação em rede e seus impactos políticos e socioculturais, campo dinâmico e atual que reconfigura o próprio paradigma da comunicação de massa a partir de conceitos como ciberespaço e cibercultura.

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